A NAU PORTUGAL
…. « de quilha ao portaló»
SENOS DA FONSECA
2007
1 -PREPARATIVOS
Dia 8 de Julho, de 1940.
O dia para a festa do bota abaixo da «Nau Portugal » não tinha sido escolhido ao acaso. Precisamente nesse dia, perfaziam-se 443 anos da data em que a Armada de Vasco da Gama partira para a descoberta do Caminho Marítimo para a Índia.
Nascera soalheira a jorna. O sol madrugara .E logo que alcandorado ao cimo dos montes, despejou o «seu doirado» sobre as águas serenas da laguna a que uma suave brisa provocava um enrugado e inquieto chocalhar; corriam tão subtis e remansosas, as águas , que pareciam não ter pressa em cumprirem o calendário lunar. Um sol liberto das barreiras das serranias ,já poderoso, descarregava dédalos de luz sobre toda a área lagunar, reflectindo-se no lençol de água que um inquieto marulhar tornava espelho multifacetado a dispersar raios fulgurantes, semeando-os em todas as direcções. Miríades de fogachos estonteantes, estrelejavam, ora se demarcando ora se confundindo na superfície das águas conferindo-lhe uma luminosidade estonteante capaz de ferir o olhar do menos precavido para com tamanha cachoeira luzente . O céu, de uma limpidez azul turquesa sem mácula de nuvens, parecia seda macia cerzida em fina feira capaz de lhe retirar os últimos cirros .O que permitia pensar, ser a ausência daqueles, intervenção dos anjos celestiais ,eles também parecendo apostados em deitar um olhar curioso ao acontecimento, não querendo, por isso, entraves para o seu bisbilhotar. Que os anjos «não tendo costas», não está provado que sejam cegos, pois, se o fossem, não poderiam ao fim da jorna contar as « suas ovelhas» ,e assim, descortinar alguma tresmalhada.
Aquele «oceano» infindo por onde à noite navegam estrelas vadias, pirilampos inquietos dispersos na imensidão à procura de esconderijo, tinha, naquela manhã estival, virado céu luminoso coalhado de gaivotas grazinas, ziguezagueando em continuo esvoaçar na procura de vitualha com que quebrar o jejum nocturno. Até ao momento em que , descortinado lá em baixo o xarabaneco que imprevidente tinha vindo espreitar à superfície - também ele no desejo de se confortar com um pouco de sol sobrante - logo se deixam cair, desajeitadas ,esvoaçantes ,qual tordilhão atingido por tiro certeiro de caçador a aterrar de corpo inteiro no montado. Quando na verdade se trata de um mergulho sobre a presa entrevista ,picanço de precisão certeira , milimétrica, a tempo de abocar o imprevidente que acaba esmagado no bico da gaivota predadora, férrea tenaz de onde, apesar do estrebuchar desesperado, o peixito é incapaz de se libertar.,pagando caro o atrevimento da espreitadela fatal . E mesmo antes de o enviar ,gorgomilos abaixo, a gaivota liga «motores» para, a toda a força, iniciar imediata descolagem, subindo de novo às alturas, pronta para nova emposta piscatória .
A convulsa inquietação provocada pelo estridulo das frenéticas gaivotas, parecia ter despertado a laguna, que mal acordada do seu sono tranquilo, logo se apressou a esparzir a maresia -suave mas penetrante fragrância de algas lagunares, temperadas pelo salgado do meio liquido - sobre os bem aventurados peregrinos que madrugaram ,para não perderem o «bota abaixo» da Nau Portugal. (segue) ....
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